O mercado de saúde no Nordeste aqueceu nestes últimos dois anos. Grandes redes consolidadas do Sudeste, muitas amparadas por fundos de investimentos, têm realizado fusões, aquisição de hospitais, redes laboratoriais e clínicas. Possíveis Parcerias Público Privadas (PPPs) também estão no radar dos investidores que estão de olho no potencial do Nordeste. O SUS mostrou sua força durante a crise sanitária da pandemia de Covid-19, evidenciando também a falta de infraestrutura de saúde, especialmente na região. Onde há ausência estrutural, surgem também grandes oportunidades de negócios para investidores privados. Os planos de saúde, por exemplo, cresceram acima da média no país no Nordeste, segundo a Abramge, associação brasileira que representa o setor – uma evolução de 4,4% em 2021 em relação ao ano anterior, enquanto o Sudeste ficou em 2,9%.
Esse crescimento impulsionou uma das maiores fusões do segmento de operadoras de saúde, entre o sistema cearense HapVida e o Grupo Notredame Intermédica (GNDI), tornando-se a maior operadora de saúde suplementar no hemisfério sul, com mais de 15 milhões de beneficiários, 60 mil funcionários e uma rede de 7 mil leitos. Segundo avaliação da Ativa Investimentos, o negócio deve gerar R$ 1,4 bilhão na linha de lucro; antes de juros, impostos, depreciação e amortização da nova companhia até 2025.
Para Marcos Novais, superintendente executivo da Abramge, que reúne 20 operadoras com quase sete milhões de associados nas regiões Norte e Nordeste, a recuperação do setor é inegável e está atrelada ao crescimento do emprego formal. “Não crescemos tanto quanto gostaríamos. Ainda estamos nos recuperando da crise de 2014, quando tínhamos 50 milhões de vidas em todo o país e reduzimos para 46,5 milhões. Agora estamos chegando aos 49 milhões de beneficiários”.
O executivo da Abramge acredita que os fatores que contribuíram para esse cenário foram o acesso ao emprego e o consequente benefício do plano de saúde atrelado à carteira assinada. Ele cita ainda os programas de manutenção dos postos de trabalho definidos pelo governo durante a pandemia e que impediram as demissões, além da própria valorização do plano de saúde pelas pessoas diante de uma crise sanitária de grandes proporções.
A fusão da HapVida com a Notredame Intermédica não é único case de investimentos em saúde no Nordeste. Ano passado, outras duas operações de peso foram realizadas. Em março de 2021, a Athena Saúde, da Pátria Investimentos, comprou o Grupo Unihosp, a maior operadora de saúde do Maranhão, cujo faturamento foi de R$ 190 milhões em 2020. No final do ano passado, foi a vez da Rede D’Or adquirir o hospital de alta complexidade Memorial Arthur Ramos, em Maceió, por R$ 371,8 milhões. Trata-se de um dos hospitais de referência na capital alagoana, com 176 leitos e capacidade de expansão para 240. A previsão é de que, sob o comando da Rede D’Or, o empreendimento alcance Ebitda de R$ 39 milhões até novembro deste ano.
Grandes redes já consolidadas no Sul e Sudeste do país também miram o Nordeste para investimento na saúde. Impulsionadas por fundos e venture capital (capital de risco) que desde 2015 podem contar com aportes de fora do país, hospitais, redes clínicas e laboratórios de diagnósticos passam por fusões e aquisições. Este mês, foi a vez da Oncoclínicas anunciar a compra do Centro de Medicina Integrada de Sergipe (Cemise) por R$ 150 milhões. Localizado em Aracaju e em mais duas cidades do estado, com dez unidades, o centro realiza mais de 3 mil consultas e 80 mil procedimentos mensais. A Oncoclínicas projeta um investimento de R$ 18,6 milhões em expansão na capital sergipana.
Na avaliação de Paulo Cunha, diretor executivo do Cemise, “todos os grandes grupos estão expandindo suas operações para o Nordeste. O mercado de saúde está aquecido nos últimos cinco anos. A região (Nordeste) tem apresentado os mesmos resultados que os grandes centros do país, com investimentos em tecnologia e qualificação do corpo médico. Essas fusões mostram potencial de crescimento e a necessidade de perpetuidade e competitividade dessas redes locais. É uma questão de sobrevivência para os negócios”.
Cunha também destaca nesse panorama as operações do Grupo DASA, que adquiriu no ano passado o Hospital da Bahia (HBA S.A.), em Salvador, por R$ 850 milhões. Segundo avaliação do grupo, a transação representa um múltiplo de 13 vezes o Ebitda da adquirida. No “pacote”, também foi quitada uma dívida do hospital com a Petros, fundo de pensão da Petrobras.
Em Pernambuco, o Grupo Fleury adquiriu o Laboratório Marcelo Magalhães, referência em medicina diagnóstica e análises clínicas no estado, com ativos avaliados em R$ 384,5 milhões. Com essa operação, o Fleury expande sua rede, por meio das marcas a+ Medicina Diagnóstica e Diagmax, em mais 31 unidades no estado.
Atenção básica de saúde pode ser foco de PPPs
A pandemia também chamou a atenção para investimentos em Parcerias Público Privadas (PPPs), onde o SUS teve um papel fundamental no tratamento da Covid-19. Para Otávio Silveira, CEO da Opy Health, braço de investimentos em saúde do fundo de private equity da IG4 Capital, trata-se de uma oportunidade para que os hospitais públicos das esferas municipal, estadual e federal recebam investimentos em infraestrutura e em tecnologia para gerar maior eficiência operacional de serviços não assistenciais.
“Recentemente comentei que acreditamos que estamos vivendo a hora e a vez do SUS e que as PPPs de infraestrutura social têm tudo para decolar. Nós realmente acreditamos nisso. Temos visto várias iniciativas neste sentido no Brasil afora e queremos estimular esses projetos também no Nordeste”, afirma Otávio.
Já na avaliação de Marcelo Mariane Andrade, diretor-presidente do Instituto Couto Maia, hospital de alta complexidade no tratamento de doenças infectocontagiosas, com 120 leitos e que opera desde 2018 em parceria com o governo baiano, ainda é preciso melhorar o marco legal das PPPs para maior atração de investimentos. Segundo ele, falta ainda melhor discernimento por parte do poder público sobre a importância desse modelo de negócio para suprir o déficit de infraestrutura de saúde do Nordeste.
“Existe uma carência desde a atenção básica até atenção hospitalar de alta complexidade. O instituto da PPP pode ajudar muito a construir essa infraestrutura. Com a primeira onda da pandemia, percebi um olhar mais empolgado de agentes privados para atender essa demanda de contratos no formato de PPP, em que o setor privado faz o investimento e ainda pode operar essa infraestrutura, diz Andrade, operador hospitalar há 25 anos.
Em sua avaliação, o grande vetor para as PPPs nos próximos anos deve ser a atenção básica de saúde nos municípios. “Claro que existem muitos hospitais por fazer, mas ainda que não seja minha área de conforto, iniciamos um processo de estudar a atenção básica e identificamos que está muito aquém do oferecimento à população. Será a grande revolução na saúde. Se não nos tornarmos verdadeiros gestores de pacientes crônicos neste segmento, o custo da saúde vai se tornar impraticável, sem freios. Será uma replicação exponencial”, conclui.
Fonte: Investindo Por Aí – 16/02/2022
Por Fabíola Lago
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