ANS libera recomposição da cobrança para planos de saúde e usuários podem ter que pagar reajuste duplo do serviço; gão de defesa do consumidor orienta clientes a se atentarem para a nova cobrança
Os usuários de planos de saúde terão que pagar a mais para manter a cobertura médica a partir deste mês. É que os aumentos que deixaram de ser cobrados em 2020 começam a chegar aos consumidores em janeiro e serão somados à mensalidade reajustada do serviço.
A cobrança retroativa foi autorizada pela Agência Nacional de Saúde (ANS), depois que o órgão determinou o congelamento dos reajustes dos contratos que fizeram aniversário entre os meses de setembro e dezembro de 2020. No período, também foram suspensas as correções dos pacientes que mudaram de faixa etária.
Segundo a ANS, o reajuste anual de 2020 foi adiado para 20,2 milhões de beneficiários e o aumento previsto por faixa etária, para 5,3 milhões. O percentual máximo nos reajustes dos contratos individuais e coletivos é de 8,14%, índice que é válido para o período de maio de 2020 à abril de 2021.
Isso significa que, a partir de agora, os usuários que mudaram de faixa etária ou tiveram o aniversário do contrato celebrado entre setembro e dezembro do ano passado, passam a receber uma cobrança mensal com até 8,14% de aumento, além da parcela do reajuste que deixou de ser aplicado em 2020.
Segundo a agência reguladora, esse valor retroativo deverá ser cobrado separadamente da mensalidade e deve ser diluído em até 12 parcelas, entre os meses de janeiro e dezembro de 2021.
Mas não é apenas com o valor retroativo que os usuários devem ficar atentos. Isso porque, além da recomposição dos valores que deixarem de ser pagos no ano passado e do novo valor da mensalidade, os consumidores devem se preparar para um novo reajuste na vigência de 2021.
Especialistas afirma que esse aumento ‘duplo’ vai afetar quem mais precisa do serviço de assistência médica: os idosos aposentados e pensionistas.
O aumento no valor do serviço é uma das preocupações da cuidadora Maria Amélia Piovani Darcie, 64 anos, que possui um contrato com plano de saúde individual há 29 anos. Com a renda mensal de um salário-mínimo, ela conta que o serviço já representa 30% do ganho mensal.
“Já está difícil de pagar esse valor. Se aumentar mais não sei o que fazer. O único jeito vai ser cancelar”, lamenta. Para a cuidadora, possuir um plano de saúde é algo essencial, já que depende da assistência médica para realizar consultas e exames por conta de uma prótese que tem no joelho e de um problema na bexiga.
Durante a pandemia, a cuidadora diz que já precisou fazer cortes no orçamento por conta dos reajustes nos alimentos, remédios e outros insumos que encareceram os produtos mais básicos. “Quando tudo aumenta, você vai cortando. Até que chega uma hora que você tem que cortar o convênio e passa a depender do SUS”, reflete.
A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) defende o reajuste nos serviços e argumenta que a pandemia exigiu contratações extraordinárias e aquisição de equipamentos em geral, de proteção individual, medicamentos e materiais hospitalares, entre outros, que tiveram um expressivo aumento de preços devido a inflação mundial. “A suspensão da cobrança é um tema bastante complexo, pois envolve lançamentos contábeis e impostos que as operadoras de planos de saúde tiveram de continuar pagando com base nos valores corrigidos – mesmo esses ainda não sendo cobrados”, informou a Associação por meio de nota.
A Abramge defende que o reajuste é fundamental para que as operadoras possam manter o bom atendimento de saúde de seus beneficiários e a disponibilidade dos serviços oferecidos.
Mas o reajuste não pode ser algo que prejudique o equilíbrio contratual, devendo ser justo para todas as partes, afirma o advogado especialista em direito à saúde, Stefano Cocenza.
“O aumento referente ao exercício de 2020, ao exercício de 2021 e ao aumento por faixa etária é possível, uma vez que se tratam de reajustes anteriormente pactuados pelas partes envolvidas. Contudo, deverão ser observados os limites previstos na ANS, nos casos dos planos individuais e familiares”, observou.
Cocenza reforça que alguns planos de saúde não tiveram o reajuste suspenso em 2020 e nesses casos, o beneficiário deverá observar se houve a incidência do reajuste agora, em janeiro.
O especialista, que também é presidente da Diretoria de São Paulo da Asociación Latino americana de Derecho Médico (Asolademe), reforça que podem ser considerados como abusivos os reajustes que façam os contratos se tornarem inviáveis, o que apresenta perda da característica do equilíbrio contratual.
“Sempre que uma parte se vê com o direito violado ou injustiçada, tem o direito de buscar as vias legais para discussão”, destaca. Ele afirma, no entanto, que muitas vezes os consumidores que esquecem que possuem obrigações contratuais.
“Por isso tem que ser bem analisado caso a caso e com cautela, procurando os órgãos de defesa do consumidor e até em último caso o judiciário, lembrando que nem sempre o judiciário é a melhor opção, pela morosidade e oneração”.
Procon orienta consumidor a ficar atento
A fundação Procon diz estar atenta às cobranças praticadas pelas operadoras de planos de saúde e orienta o consumidor a prestar bastante atenção em relação às cobranças realizadas pelas empresas. Uma das orientações para o consumidor é observar se a cobrança retroativa está detalhada, afirma Arnaldo Vieira, diretor do Procon Rio Preto até 31 de dezembro (até o fechamento desta edição, o cargo ainda estava vago).
“As operadoras podem realizar o reajuste, isso está previsto em Lei. O que deve ser observado é como esse valor será cobrado do consumidor. O correto é que ele seja avisado com antecedência, para que ele possa se programar e que esse aumento seja feito de forma gradual.”
Nos casos em que os usuários solicitem o cancelamento do contrato ou solicitem a portabilidade para outra operadora, ele não estará isenta do valor retroativo. “A pessoa precisa entender que, mesmo ela não tendo utilizado o plano, o serviço foi prestado e ela precisar pagar por ele”, reforça.
Outra orientação é de que o consumidor realize o pagamento da cobrança, mesmo que ele não concorde com o valor que está sendo praticado, para não correr o risco de fincar inadimplente e ser ainda mais penalizado.
“Quando a pessoa fica indébita ela pode ter o nome protestado e ser negativada. O Código de Defesa do Consumidor prevê isso. Por isso é importante que a pessoa efetue o pagamento e conteste depois”, finaliza. (FN)
Como deve ser o reajuste retroativo:
– Em janeiro, os usuários que tiveram o aniversário de contrato, ou que mudaram de faixa etária, no período de suspensão determinado pela ANS receberão a mensalidade reajustada e a parcela referente ao valor que deixou de ser cobrado;
– A cobrança retroativa deve ser feita à parte da mensalidade e deve ser detalhada para o usuário;
– Os valores relativos à suspensão dos reajustes deverão ser diluídos em 12 (doze) parcelas iguais e sucessivas, de janeiro de 2021 a dezembro de 2021;
– O usuário tem autonomia de solicitar à operadora do plano a diminuição ou o aumento no número de parcelas;
– Segundo a ANS, a operadora não pode cobrar o valor retroativo todo de uma única vez, a não ser que o mesmo tenha sido solicitado pelo consumidor;
– Em caso que o beneficiário solicite a portabilidade para outra operadora, ou o cancelamento, a cobrança dos reajustes suspensos ainda serão cobrados, sendo eles diluídos em 12 (doze) parcelas. Para solicitar a portabilidade, o cliente deverá estar com todas as mensalidades pagas;
– Não é necessário ter as 12 (doze) parcelas do valor retroativo pagas no momento de solicitar a portabilidade ou rescisão do contrato.
Fonte: Diário da Região – 05/01/2021
Por Felipe Nunes
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