Mercado estima que reajuste a ser fixado pela ANS para operadoras do setor deve ultrapassar 15%. No período agudo da pandemia, houve redução do uso do serviço pelos usuário
O brasileiro ainda assimila os golpes da inflação recorde para março desde o Plano Real e do aumento no preço dos remédios, mas já precisa pensar no reajuste de mais uma peça-chave do orçamento familiar mensal: os planos de saúde individuais. Eles foram contratados por 8,92 milhões de pessoas até fevereiro último, conforme dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Oficialmente, a ANS ainda não anunciou qual será o índice do reajuste para os planos de saúde individuais, mas há projeções de que essa taxa supere o recorde de 13,57%, aplicado em 2016. No ano passado, esses planos tiveram redução de 8,19%, devido à diminuição no uso dos serviços médicos em 2020, como efeito da pandemia. O aumento deve começar a valer em maio e é aplicado no aniversário de contrato do cliente.
A explicação para a alta, que pode superar os 15% previstos pelo banco BTG Pactual, se baseia na elevação dos custos das operadoras de saúde. O indicador de Variação de Custos Médico-Hospitalares (VCMH), levantado pela consultoria Willis Towers Watson a pedido do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), mostra que houve crescimento de 18,2% nas despesas dessas operadoras de planos no intervalo entre agosto de 2020 e julho do ano passado. O cálculo é feito com base na análise das despesas realizadas pelas empresas em uma carteira de 703 mil beneficiários de planos de saúde individuais.
Parâmetro. O IESS esclarece que esse percentual de quase 20% não se refere a uma projeção de reajuste dos planos individuais, apenas uma análise do custo. “É apenas um parâmetro para identificar como a carteira de consumo de serviços de saúde acompanhada se comportou no período analisado”, informa o IESS.
Também envolvida na questão, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) estima que o percentual a ser aplicado neste ano seja próximo de 16%. A Abramge alega que a retomada de parte dos atendimentos em 2021, como as cirurgias eletivas, que foram adiados no ano anterior por causa da pandemia, refletiu-se num aumento de custos dos planos. Outra razão para o reajuste elevado seria a segunda onda da Covid-19, que resultou no colapso dos sistemas de saúde público e privados de todo o país em março do ano passado.
Apesar das alegações do instituto e da associação, a advogada do programa de saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marina Paullelli, critica as justificativas dadas pelo setor. “A fórmula atual considera em 20% o IPCA (inflação), e 80% se referem à sinistralidade (relação entre o valor pago pelo beneficiário e a quantidade de procedimentos realizados por ele). Durante a pandemia, o nível de sinistralidade do setor ficou abaixo dos anos anteriores”, reforça a advogada.
Usuários já estão preocupados
Aos 90 anos, Adinor Silva fez uma cirurgia no coração no Hospital Madre Teresa, em BH. Desde então, realiza consultas a cada seis meses com um cardiologista para acompanhar o procedimento. Ele paga R$ 1.000 por mês do plano de saúde e teme um novo reajuste. “Infelizmente, com a minha idade e condição de saúde, não posso ficar sem (o plano). O médico até me disse que eu posso entrar em contato com a operadora para, eventualmente, segurar o preço atual. Vou tentar, dependendo do percentual de aumento”, diz o idoso.
Já Aline Aparecida é mãe de duas crianças: uma de 3 e outra de 8 anos. Na casa dela, apenas os pequenos contam com assistência da saúde suplementar, sobretudo em um momento no qual o brasileiro ainda aperta o orçamento diante de uma inflação acumulada de 11,3% nos últimos 12 meses. “É muito caro, ainda mais com uma crise dessa. A gente paga só para eles, porque são nossas prioridades”, afirma.
Inflação. Para o economista e especialista em políticas públicas e gestão governamental do Uni-BH Fernando Sette, o aumento nos planos de saúde individuais não será sentido de maneira imediata, mas certamente impactará a inflação dos próximos meses. “Não será sentido na casa dos 16%, porque é apenas um dos fatores do índice de inflação. Mas o recuo do dólar pode ser recompensado pelo reajuste na área da saúde suplementar. Podemos ter uma continuação (da escalada do IPCA)”, observa o economista.
O Brasil tem hoje 723 operadoras de planos saúde em atividade. O número de clientes é da ordem de 49 milhões, com cerca de 20 mil planos ativos – a maioria de maneira coletiva. Em Minas Gerais, são 5,4 milhões de usuários e 8.000 planos ativos. O número de cotas individuais é de 656.408 no Estado, enquanto os coletivos somam 4.756.661 beneficiários.
Quanto ao fluxo de caixa, números da ANS mostram que as operadoras faturaram mais no terceiro trimestre de 2021 do que no mesmo período de 2020: R$ 185,3 bilhões contra R$ 171,3 bilhões.
A advogada do programa de saúde do Idec Marina Paullelli não concorda com a versão de que houve diminuição dos lucros. Para ela, o setor continuou lucrando na pandemia. “Para fins de aplicação do reajuste, informações sobre lucros das operadoras não devem ser consideradas porque hoje existe uma fórmula, que tem critérios transparentes e auditáveis para fixação dele”, afirma.
Fonte: O Tempo – 12/04/2022
Por Gabriel Ronan
Conteúdo publicado originalmente no O Tempo
(https://www.otempo.com.br/economia/plano-de-saude-devera-pesar-no-bolso-dos-clientes-individuais-1.2652478)
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