Assunto de extrema importância para o mercado de saúde suplementar, mercado que reúne mais de 50 milhões de brasileiros com planos de assistência médica, as novas regras de capital regulatório que devem ser implementadas pelas operadoras de saúde, em vigor desde 1º de janeiro de 2023, são ponto de grande atenção e merecem uma análise mais cuidadosa.
O capital regulatório é definido como o limite mínimo do patrimônio líquido ajustado que a operadora deve reservar para reduzir a possibilidade de insolvência e fazer frente às suas obrigações. As regras relativas ao referido instituto garantem que as operadoras detenham patrimônio condizente para absorver as oscilações dos riscos da comercialização de planos de saúde.
Na norma vigente desde 2009, a ANS estabelecia um critério simples de cálculo para o capital regulatório que levava em consideração o capital base e a margem de solvência. Já na RN 451/2020, atualizada pelas RNs 468/2021 e 526/2022, foram criadas regras de transição que as operadoras deveriam ter adotado até o final de 2022, para um modelo que será completamente implantado neste ano, cujo cálculo não levará mais em conta a margem de solvência, mas sim o capital base e o capital baseado em risco composto por cinco fatores, quais sejam: risco de subscrição, de crédito, operacional, legal e de mercado, todos esses já disciplinados anteriormente pela ANS.
De fato, a implantação gradual das mudanças normativas busca incentivar a boa gestão de riscos pelas operadoras, contribuindo para a sustentabilidade do mercado e ampliando a segurança para os usuários de plano de saúde. A expectativa é a substituição de um modelo pouco flexível, baseado em cálculos com percentuais fixos, por um modelo mais transparente e moderno, que permite maior adaptação à realidade de cada operadora.
Vale lembrar que o que motivou a ANS a antecipar as exigências de garantias que estavam previstas para ocorrer neste ano foi o alto número de operadoras em situação irregular, que correm o risco de entrar em direção fiscal, medida em que é preciso ter uma inspeção mais rígida das finanças.
Neste cenário, visando maior adaptabilidade das regras que estão sendo implementadas e aproximação com o mercado, a ANS abriu a Consulta Pública nº 102, em setembro de 2022, por meio da qual foram feitas sugestões sobre as inúmeras exigências normativas. Segundo a agência, foram recepcionadas 92 contribuições, das quais 14 ocasionaram em alterações normativas.
Além disso, na 582ª Reunião da Diretoria Colegiada da ANS ocorrida em 12 de dezembro de 2022 restou esclarecido que, após sugestões apresentadas na Consulta Pública nº 102, 89% das operadoras encontraram-se regulares, restando somente o universo de 11% que ainda não estão completamente adequadas ao novo modelo.
Como apontado na reunião da Dicol, a reguladora afirma que todas as modalidades de operadora serão favorecidas com a diminuição da exigência do capital regulatório. No entanto, os impactos mais benéficos serão sentidos pelas cooperativas médicas e odontológicas, com redução da exigência de capital regulatório em dois terços e metade, respectivamente, além da medicina de grupo com redução significativa de mais de um terço.
Em contrapartida, certamente as administradora de benefícios sofrerão maiores repercussões, tendo em vista que anteriormente não se deparavam com tal obrigação em relação a solvência.
Levando-se em conta as dificuldades operacionais que as operadoras de planos de saúde enfrentam, as mudanças tendem a ser positivas, já que no final das contas reduzir o valor destinado à garantia de solvência, faz com que esses recursos possam ser empregados nas melhorias dos seus próprios serviços prestados.
No entanto, é preciso lembrar que os recursos atuais destinados à garantia de solvência não podem ser levantados, tendo em vista que estão alocados em patrimônios e não em espécie, de forma que não haverá implicação no fluxo de caixa livre das operadoras.
Destaca-se ainda que na 22ª Reunião Extraordinária da Dicol, no último dia 19 de dezembro de 2022, além de integralmente aprovada a proposta normativa a respeito de capital regulatório, o diretor Mauricio Nunes da Silva fez ressalva sugerindo que a agência avance na proposta de adoção de incentivos regulatórios financeiros para os programas de indução da qualidade e atenção à saúde. Segundo sua sugestão, caberia a extensão dos fatores reduzidos para o cálculo do capital regulatório nos programas como Promoprev, Certificação de Atenção Primária em Saúde e Certificação para o Parto Adequado, com percentuais reduzidos para o risco de subscrição de forma escalonada.
Por tudo o que se vê e o que realmente pretende a agência reguladora com a implementação de tais medidas é que as alterações, de fato, visam impulsionar o setor a uma melhora na gestão de riscos, de acordo com a realidade e porte de cada operadora.
Mais do que nunca se faz necessário garantir a segurança e higidez do mercado. Porém, as exigências precisam ser na dose certa, a fim de que não se tornem impeditivos para o desenvolvimento do setor, que vem enfrentando desafios importante nos últimos anos.
Fonte: Consultor Jurídico – 11/01/2023
Por Priscila Cordoeira*
*Advogada especialista em Direito Regulatório e Cível no Bhering Cabral Advogados.
Conteúdo publicado originalmente pelo Consultor Jurídico
(https://www.conjur.com.br/2023-jan-11/priscila-cordoeira-capital-regulatorio-operadoras-saude)
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